quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Texto que se escapuliu da "gaveta"

Johann passeava pelas ruas da cidade. Deambulava pela zona dos antiquários, observando o meio envolvente com minúcia e pormenor. Sabia que procurava algo. O quê, não o podia enunciar. Nunca gostara de teorias cíclicas que determinassem o indivíduo. O inesperado deveria fazer parte do que é, e que por sê-lo se torna esperado depois de não o ter sido.

Errava tropeçando em cadeiras e absorvendo o húmido cheiro da madeira bafienta. A dado momento parou e dirigiu o olhar para a sua direita... e viu-o. Incólume e cercado por velharias. Estava imóvel. Aguardava o fim do prelúdio que não tardaria a dar lugar à fuga. Johann aproximou-se dele e reconheceu todo o seu potencial. Levou-o para casa.

Anoitecera... ambos se contemplavam num diálogo mudo que os preparava para a mútua incorporação. Johann principiou por tacteá-lo deslizando os dedos sobre os seus contornos. Reconheciam-se...

Finalmente Johann pegara no arco e uma primeira manifestação da união ressoou grave pelas paredes de pedra. O errante estava absorto durante o primeiro contacto auditivo que tivera com ele:

- Agora já sei que estás preparado para me ouvir. – dizia-lhe Johann – As formas existem, mas para as preenchermos deparam-se-nos infinitos caminhos que preenchem toda a necessidade de imprevisto que existe.

Sem perder tempo Johann agarrou firmemente o violoncelo e, ininterruptamente, brandia o arco nas cordas e o que era som transformara-se em imagem... e, nesse momento, ele viu: a sua mulher morria, o seu filho morria, viu a sua própria morte. No entanto, a alma continuava protegida da corrupção do que é corrompido. A sua alma possuía as cordas através do arco e as imagens sucediam-se: canhões trucidavam corpos de homens, de mulheres, de crianças; chamas queimavam casas e reduziam pessoas a cinzas. De pó foste feito, pó tornarás a ser. O desfile prosseguia: uma bomba, de grandes proporções, fazia desaparecer tudo o que existia nas periferias do local onde fora arremessada; crianças nasciam condenadas a não viver, fruto da maldição de serem inocentes. Em laboratórios criavam-se vírus mortíferos que dizimaram a espécie humana, inclusive os seus criadores, descendentes de Pandora. Era o advento do apocalipse: chagas e sangue. O que existia fora sugado pelo que não existia e chegou o juízo final. O juiz do trono branco queimou o livro dos mortos e a alma que animava o violoncelo desaparecera, mas como que por inércia, o instrumento prosseguia a sua incógnita melodia. Escreveu-se um novo livro da vida.

O violino desaparecera...

Um homem num paraíso, acompanhado por uma mulher, uma serpente e uma maçã. A expulsão. O irmão que matou o irmão. O recomeço de toda a maldição.

domingo, 14 de outubro de 2007

Luís Filipe Menezes

Eu bem disse que o homem não tinha sex-appeal. Se levasse uma tampa da Soraia Chaves, vá, ainda era como o outro. Agora, levar uma tampa de uma mulher como a Manuela Ferreira Leite é de ferir o orgulho a um gajo.

A mulher que vende poemas (mais uma vez)

Afinal o negócio, tal como eu o planeara, não se concretizou. Tudo porque me esqueci de andar acompanhado por um texto que servisse como moeda de troca por um poema da mulher que os vende no Chiado. Mas sempre aconteceu uma transacção. Acedi, finalmente (também já não era sem tempo), a comprar-lhe um poema, com direito a desconto e tudo (obviamente que não o irei reproduzir aqui, porque respeito os direitos de autor).Também não tenho nenhuma crítica a fazer, nem a pretensão de dizer se é bom, se é mau, se é de qualidade ou não.

Agora, a mulher que vende poemas já me reconhece, já me cumprimenta com dois beijinhos e tudo e até me disse o seu nome e me fala sobre a sua vida. E parece que afinal a poesia avulso é matéria tributável. Uns dias depois do "negócio" reencontrei-a mais uma vez. "Ultimamente não a tenho visto por cá". "É que ultimamente tem andado por aqui a polícia.", responde-me. "A polícia? Vender poemas é crime?", interrogo. "Mais ou menos, tenho de obter uma licença na Câmara de Lisboa para os vender e tenho de me colectar nas Finanças. Só o pedido da licença são 50 euros...". Afinal as poesias, e muito provavelmente as ficções, são matéria tributável.

Percebo agora porque é que a burocracia é inimiga da poesia e, em última instância, do pensamento. De qualquer das formas, se não tiver de pagar imposto de selo, ainda tentarei trocar o meu texto por mais um poema.

sábado, 13 de outubro de 2007

Regresso ao trabalho

Depois de umas férias prolongadas, Deus regressou ao trabalho. Olhou para o estado do mundo e disse: "And now, who cleans up the mess?". E meteu baixa psiquiátrica por tempo indeterminado.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Têm de dar o desconto. Afinal, parece que o autor deste blog está ou esteve apaixonado

Vagueio pela rua contemplando as pessoas que me olham sem me ver. A cada cara desconhecida associo a tua imagem. A recordação do que nunca foi invade-me sem eu dar conta. Imagino-me a passear contigo absorvido numa felicidade imensurável. Sonho-te devaneando no espaço do não feito e do não visto. Poderia dizer que te adoro, mas não me atrevo a manifestar algo que nunca foi nem nunca será. A perfeição da tua imagem aparece-me apenas porque tudo o que possa ser contigo só pode ser em pensamento. Qualquer tentativa de aproximação ao real é uma aproximação ao interdito. Não importa… contento-me em imaginar-te imaginando-me, em viver virtualmente o sentimento de que me vives, a ser em ti ilusoriamente.

domingo, 7 de outubro de 2007

O pensamento piegas da semana

Todos já escreveram sobre ele, mas ainda ninguém o conseguiu definir, caso contrário já não seria necessário escrever sobre ele. O roçar de um arco nas cordas, o soprar de um saxofone, o toque nas teclas de um piano, tentar agarrar a vida para ela não nos fugir... tudo isso é amor. E tudo isso junto não basta para o exprimir.

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

O Dia da Implantação da República

Óptimo para coçar os tomates. Do que se conclui que ser-se republicano é ser-se perito em coçar os tomates.